Uma imagem aérea de uma floresta temperada com alguns tons de verde. Ao aparecer o título da obra na tela, essa mesma floresta começa gradualmente a perder a cor, o preto e branco domina a imagem e seguiremos assim até o fim. Tanto o título original em polonês, quanto o inglês traz uma ironia dura já que, na verdade todo o verde (verde esperança?) ou qualquer cor desaparecem da vida de nossos personagens. O título em português (confesso, menos poético) nos remete a uma área geográfica que falarei mais adiante.
A diretora polonesa Agnieszka Holland (Filhos da Guerra, 1990; O Jardim Secreto, 1993) ficciona de forma bastante perturbadora, pungente e urgente a caminhada de uma família síria (Amina, Bashir, Ghalia, Nur, Grandpa e um bebê) e uma professora afegã (Leila) entre a fronteira da Polônia e Belarus (Bielorrússia) que, cada um com suas motivações, pretendem pedir asilo em outros países europeus. Esse recorte nos tira de uma certa alienação: temos uma das piores crises humanitárias do século XXI onde milhares de refugiados migram legal ou ilegalmente para a União Européia, seja fugindo de políticas ditatoriais de seus países de origem, catástrofes ambientais (incluindo aqui as mudanças provocadas pela própria humanidade) ou radicalismos religiosos.
A fotografia (Tomasz Naumiuk) em preto em branco com certo grau de granulação nos joga dentro dessa estória densa e desesperadora. A câmera, muitas vezes nervosa, com uso de planos conjunto, americano e médio confere toda a ação que envolve a luta dos personagens para alcançar seu destino. Por vezes as coisas acontecem de forma tão rápida e brutal que ficamos um tanto perdidos na ação, e não porque há confusão na forma de filmar, e sim, porque estamos no olho do furacão. Quando percebemos já estamos chocados e sem acreditar na malha de eventos que envolve violência dos policiais fronteiriços, fome, frio, sede, humilhação, abandono, racismo, xenofobia e até roubo por parte desses mesmos policiais. Nem as crianças são poupadas (como esquecer a imagem de uma criança refugiada afogada numa praia da Turquia em 2015). E como se não bastasse, nossos personagens são jogados de um lado para o outro da fronteira através de uma ação ilegal chamada de pushback, onde os refugiados são forçados a recuar através de uma fronteira logo após atravessá-la. Em determinado ponto do filme cessa o pushback e todos são levados à zona de exclusão a que se refere o título em português e, onde não pode entrar jornalistas e nem ajuda humanitária.
O filme se divide em capítulos e outros personagens vão aparecendo ao longo da obra: mais refugiados em desespero crescente a ponto de disputar água entre si, um policial fronteiriço com dor na consciência (Jan), uma psicóloga (Julia) que após presenciar uma tragédia se une a uma organização de ajuda humanitária mas, de poder muito limitado. Há algum respiro com a entrada de Bogdan, personagem muito crítico às políticas de extrema-direita do governo Polonês e que ajuda a esconder um grupo de jovens africanos. As cenas que envolvem o resgate e o esconderijo, culminando com o Rap cantado por esses jovens e os filhos de Bogdan são de aquecer nosso coração.
De forma eventual, personagens ajudam refugiados, enfrentam a polícia, se indignam com os acontecimentos de forma que a primeira ideia é que ainda há esperança para nós. Porém, é muito pouco ou quase nada diante da atual agressiva geopolítica praticada no mundo. Um filme devastador e que no capítulo final, escancara toda a hipocrisia das leis sobre imigração, quando vemos a chegada de milhares de ucranianos à Polônia e como estes são tratados. Como diz um personagem a uma certa altura: “meu único crime é ter o pior passaporte do mundo”. A diretora Agnieszka Holland do alto dos seus 75 anos nos dá uma aula de coragem.
Curiosidades: me surpreendi após uma pesquisa sobre a diretora e descobri que alguns episódios de séries conhecidas foram dirigidos por ela: The Wire, The Killing e House of Cards.
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